Alguns mitos cercam o registro das deliberações de sócios e alterações contratuais das sociedades limitadas (tipo societário mais utilizado no Brasil), e este artigo pode esclarecer um pouco o que pode ser dúvida de empresários, contadores e despachantes.
Alteração contratual sem unanimidade
Como já demonstramos no artigo de 6 de outubro deste ano, não é necessário que todos os sócios assinem uma alteração contratual. Inexistindo a presença, ou a concordância de todos, é possível deliberar e alterar o contrato social contando apenas com a maioria. Para tanto, realiza-se uma reunião ou assembleia de sócios, delibera-se por maioria, e na sequência, os sócios que compõem a maioria assinam a alteração do contrato social.
Convocação para reunião ou assembleia de sócios
Para a realização de qualquer reunião ou assembleia, é necessária a convocação, a qual deve se dar de acordo com o estipulado no contrato social, ou, na ausência de qualquer disposição nesse sentido, na forma da lei: publicação de três anúncios, com antecedência mínima para a assembleia ou reunião de oito dias para o primeiro anúncio, e cinco para o último.
A forma de convocação é algo normalmente negligenciado nos contratos sociais, mas que merece uma atenção por parte dos empresários e contadores.
A previsão contratual da forma de anúncio (pessoal, por e-mail, telegrama, carta registrada, publicação etc.) confere maior praticidade e segurança jurídica à relação entre os sócios.
Segurança, porque o anúncio pode não ser lido por um sócio específico, e o mesmo ver-se alijado de alguma reunião em caso de má-fé dos demais sócios. A previsão contratual de ao menos uma convocação pessoal supre esse problema.
E praticidade, porque um telegrama é mais rápido e menos custoso do que três anúncios em jornal que corre grande risco de não ser lido por ninguém.
Sem necessidade de assinatura de testemunhas
O código civil de 2002, ora vigente, deixou de exigir a assinatura de testemunhas nos contratos sociais. Contudo, tal prática permaneceu sendo exercida por muitos sem necessidade. Assim, considerando que a legislação não exige, e não há no contrato social qualquer obrigação de pagamento executável, de modo que o mesmo possa ser utilizado como título executivo extrajudicial (art. 784, III do CPC), a indicação de testemunhas não traz qualquer benefício e pode ser suprimida em nome da praticidade.
Desnecessidade de reconhecimento de firma
De igual sorte, não há lei que determine reconhecimento de firma nas assinaturas dos sócios. O Código Civil nunca exigiu, e a lei de registros (Lei n° 8.934/94), ao contrário, sempre dispôs em seu artigo 63 que os atos levados a registros estão dispensados de reconhecimento de firma.
Algumas Juntas Comerciais exigiam tal providência para facilitar o trabalho dos vogais no reconhecimento de veracidade da assinatura. Contudo, a Instrução Normativa DREI n° 81/2020, em seu artigo 28, I, expressamente dispensa, o que fez as Juntas Comerciais cessarem a descabida exigência.
Desnecessidade de divulgação do valor de venda de quotas
Outro mito cultivado por muitos é acreditar que nas alterações contratuais nas quais há venda de quotas faz-se necessário indicar as condições pelas quais as mesmas são vendidas: preço, prazo etc.
Não há qualquer obrigação legal nesse sentido. Basta informar quais quotas são vendidas, quando, por quem, para quem, e mais nada.
Condições comerciais, valores, e outros aspectos da negociação são informações sigilosas entre as partes, devem constar em um contrato de compra e venda de quotas, celebrado em separado da alteração contratual, assinado e guardado sem necessidade de registro ou publicação.
Desnecessidade de alvará judicial em caso de falecimento de sócio
A IN DREI 81/2020 trouxe um novo regramento para as Juntas Comerciais nesse tema, aproximando-se do disposto no artigo 1.031 do Código Civil, o qual prevê: “nos casos em que a sociedade se resolver em relação a um sócio, o valor da sua quota, considerada pelo montante efetivamente realizado, liquidar-se-á, salvo disposição contratual em contrário, com base na situação patrimonial da sociedade, à data da resolução, verificada em balanço especialmente levantado”.
Ou seja, se o herdeiro não vai entrar na sociedade, e há previsão contratual para a liquidação das quotas, não há o que se falar em alvará judicial!
O alvará só se faz necessário se as quotas do espólio são transferidas para alguém. Se, ao contrário, ocorre tão somente a sua liquidação, trata-se de um ato societário, independente da vontade dos herdeiros – e muito menos do juiz de sucessões –, realizado pelos sócios remanescentes, com o depósito do valor à disposição do espólio. A destinação de tal valor, ou sua repartição entre os herdeiros, será decidida na partilha, mas nesse estágio a sociedade não terá mais qualquer relação com o fato.
Com a liquidação demonstrada em alteração contratual, faz-se a retirada do espólio do sócio falecido do quadro societário sem a necessidade de assinatura de inventariante ou autorização judicial.
FONTE: MSA ADVOGADOS